A MOITA DO MOITA

A MOITA DO MOITA

Eu só não quero é ter remorso.

10 fevereiro 2006

Canções infantis

Sou engenheiro, portanto não sou filósofo, nem pedagogo e muito menos educador da infância. Mas acho que conversando com alguns amigos, levantamos uma tese que tenta explicar porque nós brasileiros somos medrosos, não brigamos pelos nossos direitos, nos acovardamos diante de atitudes cívicas e nos escondemos na hora que, exatamente, deveríamos lutar.

A culpa está nas canções de ninar, nas fábulas e historias infantis contadas as nossas crianças.
Nos Estados Unidos as canções pra criança dormir são assim: traduzidas é claro:

“Boa noite, linda menina, durma bem.
Sonhos doces venham para você,
Sonhos doces por toda noite”...

No Brasil é assim:

Boi, boi, boi.
Boi da cara preta
Pega essa menina...............

Vejam só: o boi, a gente, que é adulto, até conhece sua reações e agressividades; as crianças, nem sei se conhecem. Mas tudo bem, pelo menos, as nossas crianças conhecem boi.

Nana neném que a cuca vai pegar...

Esse bicho, nem eu conheço, imagina as crianças.

Vejam o que diz um amigo da minha amiga Maria Elizabeth que lhe mandou um e-mail e não quis se identificar:

O problema do Brasil é que a sua população em geral tem uma auto-estima muito baixa. Isso faz com que os brasileiros se sintam sempre inferiores e ameaçados, passivos o suficiente para aceitar qualquer tipo de extorsão e exploração, seja interna ou externa. Por que isso acontece? Trauma de infância!!!! Trauma causado pelas canções da infância.!!!!

Vou explicar: nós somos ameaçados, amedrontados e encaramos tragédias desde o berço! Por isso levamos tanta porrada da vida e ficamos quietos.
Exemplificarei minha tese:

Atirei o pau no gato-to-to
Mas o gato-to-to não morreu-reu-reu
Dona Chica-ca-ca admirou-se-se
Do berrô, do berrô que o gato deu,
Miaaau!

Para começar, esse clássico o do cancioneiro infantil é uma demonstração clara de falta de respeito aos animais (pobre gato) e crueldade. Por que atirar o pau no gato, essa criatura tão indefesa? E para acentuar a gravidade, ainda relata o sadismo dessa mulher sob a alcunha de "D.Chica". Uma vergonha!

Eu sou pobre, pobre, pobre,
De marré, marré, marré.
Eu sou pobre, pobre, pobre,
De marré de si.
Eu sou rica, rica, rica,
De marré, marré, marré.
Eu sou rica, rica, rica,
De marré de si.

Colocar a realidade tão vergonhosa da desigualdade social em versos tão doces!! É impossível não lembrar do seu amiguinho rico da infância comum, carrinho fabuloso, de controle remoto, e você brincando com seu carrinho de plástico... Fala sério!!!

Vem cá, Bitu! Vem cá, Bitu!
Vem cá, meu bem, vem cá!
Não vou lá! Não vou lá, Não vou lá!
Tenho medo de apanhar.
Quem foi o adulto sádico que criou essa rima? No mínimo ele espancava o pobre Bitú.....

Marcha soldado,
cabeça de papel!
Quem não marchar direito,
Vai preso pro quartel.

De novo, ameaça! Ou obedece ou você vai se fu..... Não é à toa que o brasileiro admite tudo de cabeça baixa....

A canoa virou,
Quem deixou ela virar,
Foi por causa da (Fulana)
Que não soube remar.

Ao invés de incentivar o trabalho de equipe e o apoio mútuo, as crianças brasileiras são ensinadas a dedurar e a condenar o semelhante. Bate nele, mãe!

Samba-lelê ta doente,
Ta com a cabeça quebrada.
Samba-lelê precisava
É de umas boas chineladas.

Samba-lelê, encontra-se com a saúde debilitada e necessita de cuidados médicos. Mas, ao invés de compaixão e apoio, a música diz que ela precisa de palmadas! Acho que o Samba-lelê deve ser irmão do Bitú......!!

O anel que tu me deste
Era vidro e se quebrou.
O amor que tu me tinhas
Era pouco e se acabou...

Como crescer e acreditar no amor e no casamento depois de ouvir essa coisa anos a fio??

O cravo brigou com a rosa
Debaixo de uma sacada;
O cravo saiu ferido
E a rosa despedaçada.
O cravo ficou doente,
A rosa foi visitar;
O cravo teve um desmaio,
A rosa pôs-se a chorar.

Desgraça, desgraça, desgraça! E ainda incita a violência conjugal.

Ah!!! Você esqueceu desta:

Passa, passa, (três vezes)...
o último que ficar
tem mulher e filhos
que não pode sustentar...

Aí, ter mulher e filhos que não pode sustentar fica super normal e ainda passa três vezes. Começa a se aceitar o desemprego como uma normalidade, Mas uma “normalidade” brasileira.

Bem, se você não conhece todas essas musiquinhas, não se desespere. É porque o Brasil é grande.

Nem vou falar das historinhas infantis. Aquelas que têm a mania de sempre levar a menina pra dentro do mato. Isto será prosa pra outro post.

Obs: Eu já tinha metade deste post pronto, aí, recebi parte deste texto por e-mail, sem créditos. Publiquei exatamente aquela parte que recebi, exatamente, como estava escrito e tem muito caco que eu enfiei aí pelo meio. Já não sei mais quem é o autor.

Amoitaram-se

32 Comments:

At 4:09 AM, Anonymous Anônimo said...

Moita

Não me interessa se o seu post tem mais de um autor.

O que me interessa é que acredito nessa teoria que vc esclareceu tão bem.

Aliás, vc escreve com uma didática que me impressiona.

vc ensina, e a gente aprende, mesmo não querendo.

adoro ler vc.
beijos.

 
At 7:13 AM, Blogger SV said...

Oi Moita!

eu já havia lido algo sobre isso, mas você foi fundo, rico em detalhes.

Nossas canções de ninar vem de outras épocas recheadas de escravagismo, patriarcado, opressão e outras doenças. Hoje, embora muita gente repita-as sem pensar, pelo simples fato de trazer recordações da infância numa melodia suave, acho que estão sendo revistas. Já escutei algumas em versões policitamente corretas. Algumas até se salvam, mas a maioria fica um desastre.

Experimente:
Eu sou economicamente prejudicado, prejudicado, prejudicado
De marré, marré, marré...

ou

Marcha soldado,
cabeça inocente!
Quem não marchar direito,
Vai ter que praticar.

Melhor fazer novas!!

Moita, fico lisonjeado com tua "ameaça"! Podes publicar quantos textos meus quiseres, seja do Uni-verso, do C & E, ou do Antes que Anoiteça! Tenho a maior satisfação de encontrar meus textos pela Internet, ainda mais no teu! Nossa!

 
At 9:47 AM, Blogger Lúcia said...

Moita, existe muitos estudos referente aos medos infantis, e abordam aquelas cantigas que colaboram para fortalecer esse medo no imaginário da criança. Foi muito bem lembrado. Vê-se que como engenheiro o Moita pode ser um excelente psicólogo.

 
At 11:00 AM, Anonymous Anônimo said...

http://somagui.zip.net
Pode ser... Quem sabe... E uma tese.

 
At 11:39 AM, Blogger Patrick Gleber said...

Moita,


Um acordo entre PFL, PSDB, PP e PT livrou o deputado Pedro Henry (PP-PE) do corredor da morte no Conselho de Ética

Veja mais no

www.pensarpolitico.blogspot.com

 
At 12:11 PM, Blogger Saramar said...

Moita, boa tarde.
O tema é interessantíssimo. E seu post, como sempre, está fabuloso! Como disse um dos comentaristas você é perfeitamente didático!
Se não me engano, este assunto foi tratado em Casa Grande & Senzala.
Lembrou-me também Admirável Mundo Novo e aquelas táticas de internalização de conceitos repetidos ad nauseum, enquanto as criaças dormiam.
Quanto aos contos de fadas, li algo muito interessante em "Repressão Sexual", de quem? Dela, a execrada Marilena Chauí.

Beijos

 
At 12:25 PM, Blogger Bell... said...

Moita, meu Deus do céu!!!!
cada parágrafo que fuii lendo, davo um sorrisso...
Deus meu...
só vc msm(ou seja lá quem escreveu contigo), para esclarecer a "bosta" do Brasil com canções de ninar!!!!
Isso que é imaginação...
acho que foi um dos seus que mas gostei...
bjs*

p.s.->qnd entrar no msn, fale com os amigos...seu bobo!!!!

 
At 12:40 PM, Blogger Vera F. said...

Já que a Moita não foi no Verdes, o Verdes veio na Moita...rsrs.

Gostei dos versinhos comentados. É por aí mesmo. Somos desde pequenos ensinados a ter medo do que não existe.

Bom fim de semana. Bjos.

 
At 4:35 PM, Anonymous Anônimo said...

Moita,
acabei de ler seu post para minha mãe e ela ficou horrorizada!!! Jamais imaginou que fosse tão cruel ao me ninar. hehehehehe

Mas, lembrou de uma cantiga que a redime um pouquinho:

Tutu marambá,
Não venha mais cá...
Que o pai da menina
Manda te matar...

De qualquer forma, protege a menina mas o pai é violentíssimo, não????
háááááááááááá

Beijocas

 
At 5:18 PM, Blogger Moita said...

Gusta
beijos

Eu devia ter consultado sua mãe antes que eu poderia ter incluído essa.
Matar tb era uma coisa ensinada às meninas.

Tem outra que esqueci.

Se essa casa, se essa casa,
fosse minha, eu manda......

Veja só o menino já induzido a aceitar morar de aluguel, e não pode fazer nenhum beneficio na casa alugada.

 
At 5:32 PM, Blogger Serjão said...

O texto é ótimo. Já o conhecia e valeu a releitura. Abs

 
At 5:54 PM, Anonymous Anônimo said...

Moita,
vc despertou minha curiosidade crônica!!!
Fui pesquisar o Tutu Marambá (não sabia o que era).
Veja que interessante, tem a ver com o Boi da Cara Preta:

No Brasil, em particular, deve-se a divulgação do canto-lento à mãe africana, ora embalando com carinho, ora invocando seres mágicos, para o conforto e o terror de suas crianças e dos filhos da casa-grande.
Ao lado do boizinho da cara-preta, encontram-se a cuca e o papão, de origem portuguesa, também o pavão, além dos tutus de África: Tutu Zambê, Tutu Marambá ou Tutu Marambaia. Esse bicho assombrador possui dupla identidade na matriz de nossos costumes e de nossa misturança étnica e lingüística: ao Marambá, dos povos indígenas, somou-se o Tutu que vem da palavra quitutu, de origem quibunda de Angola; o termo marã, como se sabe em tupi-guarani, significa coisa ruim, velhaco ou espírito mau. Segundo Mário de ANDRADE:
Os tutus, que variam conforme a região, são animais informes e negros mencionados em acalantos. Não existe uma descrição detalhada do mesmo, mas é com ele que se amedronta a criança que não quer dormir. Além do tutu-marambá, ou marambaia, há ainda o tutu-zambê, ou tutu-do-mato, ou bicho-do-mato, que figuram em cantigas populares.

Partindo do texto, podemos entender e tirar muitas conclusões à respeito do nosso modo de ser, não?
Beijocas

 
At 6:10 PM, Blogger Moita said...

Serjão

Você pode ter conhecido o e-mail que recebi que deve ter circulado por aí. Agora todos os meus comentários que eu, por assim dizer, acabei de criá-los, é anti-lógico.

Ah! ... ia me esquecendo, você comenta do Céu.
Desculpe-me, está explicado.

Um abração.

 
At 7:05 PM, Anonymous Anônimo said...

Moitinha q post maravilhoso, adorei!

Preciso cantar uma "cantiga de roda" pra ocê, agora a escolha é dificil, ms essa vai especialmente p nós dois...
"O moitinha potiguar, sofreu uma queda foi ao chão, acudiu três mocinhas, tds três c uma flor na mão, a primeira foi dona Moita mãe, a segunda Moitinha irmã, a terceira, foi aninha q lhe entregou seu coração..."
Brincadeirinha!
Beijos Poéticos.
;*******
saudades.

 
At 9:36 PM, Blogger Santa said...

Moita querido, tenho uma tarefa pra você. Tá lá no blog.

Bjs

 
At 9:38 PM, Anonymous Anônimo said...

A culpa dos problemas brasileiros é do autor de "batatinha quando nasce, põe a rama pelo chão.menina quando dorme põe a mão no coração"
Propositadamente o autor levou o povo brasileiro ao sono ao mesmo tempo em que o mandava plantar batatas;
Assim não. O cara devia estar a serviço de Gramsci ou de Trotsky.

 
At 12:55 AM, Anonymous Anônimo said...

hahahahaha Moita, vc é impagável! Ai q dor de lado, cara, vc quase me faz explodir de tanto rir rsrsrs

E depois, se algum brasileiro(a) consegue melhorar a auto-estima,passa a ser visto(a) como metido(a), esnobe e por aí vai. Nosso povo tem baixa auto-estima e um olho cooommpprrriiiddooooo. Repare!

O que sei é q adoro 'ficar atrás da moita' contigo! Um findi maravilhoso pra vc.

 
At 12:57 AM, Blogger Jean Scharlau said...

Moita, veja o caso por outro lado também - as crianças norte-americanas não têm isso que nós temos, segundo entendi do início do texto, o que lhes faz imensa falta, é o que digo, pois depois de velhos ficam fazendo esses filmes debilóides de terror adolescente e tiroteios adultos - é pura falta dessas canções na infância. Abraço. Jean Scharlau.

 
At 1:21 AM, Blogger Jean Scharlau said...

O tema, devido à sua importãncia, pede maior aprofundamento, então colaboro fazendo este segundo comentário.

As crianças reagem de modo diferente, assim as que se acomodam e aceitam essas mensagens subliminares como receitas diretas e confiáveis viram alienados, comodistas, neoliberais, psdbistas, pefelistas, pepistas...

Já as que questionam as mensagens, que percebem sua dialética e papel, se rebelam, tornam-se esquerdistas, comunistas, socialistas, petistas...

Fica tranqüilo portanto, caro Moita, estás no bom caminho.

Jean Scharlau.

 
At 1:35 AM, Anonymous Anônimo said...

Ainda bem que os cineatas brasileiros fazem filmes puros e deliciosos como Carandiru,O virgem de Itu,Costinha Tarado, Assalto do Trem Pagador , |Lampião,Surfistinha e suas amigas e outros que traduzem as deliciosas canções infantis

 
At 1:57 AM, Anonymous Anônimo said...

Muito bom!!!
Você escreve muito bem!!!
A análise está perfeita!!!
Também sou fã do Silvio.Os poemas dele são maravilhosos.E a música que ele colocou no site é linda.

 
At 2:13 AM, Blogger Moita said...

Jean schalau

É o petista mas engraçado e espirituoso que eu conheço.
rssssssssss

Ele me mata de rir.

Jean, um abração, amigo.

 
At 8:45 AM, Blogger Santa said...

Moita,

Os fantasmas da infância estão presentes, herdados das doces e falsas cantigas de ninar. Agora são adultos, cresceram, de personagens-ingênuos hoje monstros capazes de amedrontar a humanidade .

Discordo das teorias que defendem as cantigas infantis preconceituosas, classistas e sádicas, e de subliminar efeito como amadurecimento psicológico de crianças para o enfrentamento de mundo. São matrizes equivocadas. Foram criadas sem autoria - de domínio público, geradas em sociedades autoritárias e, propagadas em sua manutenção.

Moita, fico grata de me fazer lembrar do que não posso esquecer: que uma criança ao dormir possa sonhar os sonhos que desejar...

Beijos no coração

 
At 1:02 PM, Blogger Unknown said...

Graaande Moita!
Meta alcançada! Obrigado pela visita! Abraços,

Vinícius Factum

 
At 1:48 PM, Anonymous Anônimo said...

Moitaaaaaaaaaaaa
Como fomos esquecer do famoso:
Dorme nenem,
Que a cuca vem pegar (socorrooo)
Papai foi pra roça
Mamãe foi passear (heim???)

hááááááááa
Beijocas

 
At 4:10 PM, Anonymous Anônimo said...

Moita

eu nunca tinha pensado por esse lado, mas vc está certíssimo! Desde pequenos nos amedrontam com coisas que dão pesadelos horrendos... Humof! Por isso me tornei uma adulta frustrada e medrosa..... hehehehe Culpa: cânticos e ninar, que deveriam se chamar de amedrontar...

 
At 10:57 PM, Blogger oakleyses said...

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